Eu nunca fui uma garota comum e só agora, depois de anos, que fui descobrir o porquê. Sempre me senti excluída, diferente, deslocada no meio das pessoas. Sempre me senti profunda demais diante do mundo raso em que eu vivi e ainda vivo. Sempre tive dificuldade em me adequar, em me enturmar e seguir padrões irritantemente impostos pela sociedade em geral. Sempre tive dificuldade em pedir ajuda a quem me cercava, pessoas que naturalmente deveriam me ajudar/amparar nunca tomaram conhecimento do que eu precisava. Eu nunca falava aos outros como eu realmente me sentia, só fingia sorrisos e cultivava uma "pseudofelicidade" angustiante. No fim das contas, deu certo. Ninguém nunca percebeu durante esse tempo todo.
Sempre fui carente, sensível e por vezes, muito estranha, até pra mim mesma. Por mais que eu soubesse que eu não estava sozinha e que alguém em algum lugar gostava de mim, eu sentia o oposto e me deixava consumir pela tristeza infinda que parecia se multiplicar principalmente antes de eu ir dormir. Distúrbios do sono sempre foram "a minha praia" também - ora por medo de dormir, ora por querer dormir como se não houvesse amanhã - uma droga! Fora os constantes pesadelos...
Depois de muito tempo eu conheci alguém que parecia me entender, que me deixava falar sem me julgar e que ao contrário dos outros, parecia se importar de verdade, me notar e que acima de tudo, queria que eu fosse feliz, assim como todos merecem ser. E eu o perdi. Ele, que me dava tantos conselhos e que me dizia para ser forte e brigar pela minha felicidade, não aguentou a pressão do mundo e se foi. Ele terminou com uma bala na cabeça, bala que ele mesmo colocou. Eu o perdi, pra sempre.
Sem alicerce novamente, lá estava eu, procurando um sentido para a minha existência. Um motivo decente para que eu estivesse nesse mundo, já que tudo parecia fútil demais, as pessoas, os propósitos, o caminho. Passei a ver as pessoas como ovelhas, sempre esperando a próxima ordem do seu pastor. Me perdoem, eu nunca quis ser uma ovelha. Eu sempre estive pensando, o tempo inteiro. Cada minuto de silêncio meu significou um minuto conhecendo a mim mesmo, viajando pela essência do meu ser e pela tragédia da minha ordinária vida. Aliás, acho que a grande tragédia da minha existência é muito pensar e nada conseguir fazer. Sei todas as respostas e nunca as uso, não consigo e isso sim, é trágico.
Minha vida está começando e temo ficar louca um dia. Meus pensamentos são mais do que eu consigo aguentar, é a criação matando a criadora aos poucos. "Penso, logo existo."? Droga, Descartes! Queria eu que minha filosofia fosse essa. Mas eu penso, logo questiono SE eu de fato existo, logo me perco na minha própria existência, logo fico louca... Ou quem sabe, definitivamente depressiva.
O Sol se despedia enquanto dezenas de pessoas o assistiam ir lentamente. Parei para pensar nesse trajeto diário do Sol, nessa rotina interminável de ir e vir todos os dias e no fato de nós muitas vezes nem darmos importância a isso. Estávamos ali esperando o anoitecer, a brisa do mar tocava nossos rostos e eu sentia braços ligeiramente trêmulos me envolvendo com uma ponta de desespero, eu diria. O Sol ia embora e parecia me levar aos pouquinhos, o clima era de despedida e apesar da melancolia no ar, eu sorria. Uma mistura de sensações e sentimentos que me deixaram inerte, atônita.
Pensei em cada pôr-do-sol que perdi, em cada vez que deixei de ver aquele belo espetáculo. Era a primeira vez que eu via isso, assim, com alguém do meu lado. Também era a primeira vez que eu me sentia tão bem guardada em alguém, leve que só. Mantive meus olhos fechados por alguns segundos, só para deixar cada um dos outros sentidos trabalhar. Minha audição captava vozes, sussurros, como os de alguém que não quer atrapalhar um filme bom ao fazer um comentário fora de hora. Meu tato registrava cada centímetro da pele lisa e macia dos braços de quem agora me apertava contra o corpo, como se não quisesse me soltar para partir. Sentia no paladar um gosto agridoce, um gosto que eu ainda não conhecia. No meu olfato, "cheiro de mar", cheiro que eu adoro, aroma de vida boa, sabe? Mas ao mesmo tempo eu sentia um perfume doce no ar, "cheiro de amor", assim o defini.
Abri os olhos, o Sol já estava quase indo embora de vez, esse era o seu último adeus. Essa era a hora em que o Sol nos deixaria para brilhar para outras pessoas, em outros lugares. Mesmo sabendo que ele voltaria logo, aquilo era uma despedida e depois de um dia inteiro achando "natural demais" o ter brilhando sobre nós, agora percebia a importância que ele tivera nas horas em que esteve ali. Tal como o Sol naquele momento, pensei em tantas as vezes que percebi a importância de algo apenas quando ela já estava partindo e quase chorei.
Fechei os olhos por um instante e ouvi alguém dizer baixinho ao pé do meu ouvido: "Eu te amo muito." Senti um misto de felicidade e dor, tristeza inevitável. Retribui as palavras, exteriorizando o amor que eu também sentia e apertei, apertei com força aquele alguém que fazia eu me sentir assim, viva. "Obrigada por isso." eu disse baixinho. Então ouvi palmas, o público aplaudindo ao fim daquele espetáculo, o Sol se foi. Eu estava indo junto com ele, mas assim como o Sol eu voltaria também, logo.
Assinar:
Comentários (Atom)